29.4.03
 
Hoje chegou em minha caixa de correpondência o CD-ROM "Project SMiLE". "SMiLE" é o lendário disco dos Beach Boys que nunca saiu (por sinal, continuo devendo um post especial sobre essa pérola), por diversos motivos. Abortado em 1967, o álbum que seguiria o caminho inaugurado pelo clássico "Pet Sounds" foi direto para as gavetas da Capitol Records e assim permaneceu até meados dos anos 80. Os caras da Capitol entregaram essas gravações masters a Mark Linnet, engenheiro de som de Brian Wilson e um especialista em Beach Boys, e o incumbiram de reunir as fitas de forma coerente e tentar entregar sua versão do que Brian Wilson pretendia fazer em 1966-67. Problema: "SMiLE", quando interrompido, não estava completo o que resulta num pepino dos grandes para Linnet - imagine ter de dar completude a algo inacabado. Para piorar, Wilson vinha aprimorando sua técnica de produção de forma que ele trabalhava as músicas em seções, em partes que eram constantemente modificadas e regravadas com um experimentalismo surpreendente quando o assunto é Beach Boys. É incrível observar que várias melodias e seções poderiam ser aproveitadas em diferentes músicas - elas encaixam perfeitamente.
Assim, o material bruto é um conjunto de masters formando um verdadeiro quebra-cabeças com peças desnecessárias e infinitas combinações. Linnet tentou e parte de seu trabalho foi aproveitado pela Capitol como material inédito da caixa "Good Vibrations: 30 Years of Beach Boys" lançada nos EUA em 1993. O que Linnet fez foi utilizar seus conhecimentos e experiências da época para juntar aquilo que ele considerava "quase pronto" ou "coerente". Desta forma, Linnet apresentou sua versão que ainda assim é contestada por muitos, mas geralmente aceita pela comunidade Beach Boys como algo próximo do original. Paralelamente, dezenas de bootlegs passaram a ser editados, principalmente nos anos 90 quando as companhias pirateiras prensaram discos com essas masters e versões supostas do que seria o álbum final.
Assim como Linnet, centenas de fãs, de posse das versões demos e bootlegs de masters passaram a criar suas próprias visões de "SMiLE", alguns apenas combinando as faixas de forma a organizar como Brian o faria, outros editando as faixas com colagens e experimentações. Paralelamente, construiu-se na rede uma infinidade de discussões e homepages especializadas no álbum, com receitas de como construir seu próprio álbum e teses sobre como organizar as músicas de forma coerente. Em meio a tantas versões, originais ou modificadas, o fã principiante que se interessa pelo mundo mágico de "SMiLE" acaba enfrentado uma grande confusão até chegar em músicas aceitas como "razoáveis". Eis que para facilitar as coisas, um grupo de fanáticos por "SMiLE" teve a genial e beneficente idéia de reunir em um CD-ROM um material básico sobre o álbum, sendo este o tal "Project SMiLE" que repousa em minha mesa neste momento.
O CD-ROM agrupa, além das MP3s das faixas, fotos dos encartes originais encomendados pela Capitol, artigos interessantes, 2 vídeos bacanas e até remixes. Tudo organizado de forma compreensiva, com ícones e algumas animações dando um toque especial ao projeto. De fã para fã ,tudo já mastigadinho.
Os caras têm uma lista de discussão no Yahoo em que você se cadastra e solicita uma cópia de CD. Em pouco tempo você é contatado e alguma alma caridosa lhe remeterá pelos Correios um CD, sendo que se tiver copiadora você deverá copiar o CD para mais 2 pessoas. Assim, como uma espécie de corrente, fácil e pela boa causa. Essa é uma boa sugestão para quem quer iniciar sua incursão no único álbum mutante que conheço, um quebra-cabeças tão complicado que nem Brian Wilson conseguiu montar.

ouvindo: Sparklehorse - "Someday I Will Treat You Good"

28.4.03
 
!!!Beleza!!!
17 de junho de 2003 - Bar Opinião - Porto Alegre/RS - Los Hermanos lançando Ventura, o novo álbum.
Tô lá. Certo.

27.4.03
 
Puxei meus últimos e míseros reais e encomendei:
- Tomahawk: "Mit Gas"
- Kid 606: "Down With The Scene"
- The Beach Boys/Brian Wilson: "An American Band/I Just Wasn't Made For These Time" (DVD)

É esperar chegar e em breve devem estar carinhosamente avaliado por esse que escreve.

E mais: Tô tri faceirito que a gravadora Ipecac está se aprochegando à turma do Queens Of The Stone Age. Em junho eles lançam o trabalho paralelo do baixista peladão Nick Oliveri, o Mondo Generator ("A Drug Problem That Never Existed", segundo disco). Eles vão botar na prateleira o último do QotSA, "Songs For The Deaf", em versão vinil (não me perguntem como). E o papo é forte quanto à Ipecac ser a nova casa do projeto experimental do mago Josh Homme, as famosas "Desert Sessions", que por sinal devem contar com a participação de Polly Jean Harvey. Alguém aí vê chances de projetos/shows combinando Patton e o QotSA? É... eu também.
Enfim, para quem quer saber, tanto o Mondo Generator como o QotSA saem em 4 de junho (lá fora, é claro - tô falando de Ipecac, porra).

26.4.03
 
Vai ser meio phoda, mas vou tentar:

Mr. Bungle - "Disco Volante" (1995): Em 1995 a gente não tinha internet e as minhas únicas fontes de informação a respeito de lançamentos e catálogos eram a finada revista Bizz ou as lojas de discos. Em Porto Alegre, a oferta sempre foi (e continua sendo) mais modesta que em São Paulo e os lançamentos importados chegavam até certo ponto. Se a banda fosse conhecida o CD chegava na sexta-feira (lembrando que os CDs saem nos EUA às terças), se a banda fosse desconhecida, mas em ascenção, demorava um pouco mas acabava pintando. Se a banda fosse obscura, nem pensar - só encomendando. O problema era descobrir que uma determinada banda existia de fato, poi se a Bizz não publicasse ou se as lojas importadoras ignorassem, aí era dose. Sobrava os programas "selecionados" da MTV como o Lado B e o Gás Total. Pode ter certeza que muita coisa que eu comprei nos anos 90 vieram por influência/recomendação dessas três fontes.
Mas, de vez em quando, milagres aconteciam. Tipo, entrar na hoje decadente CD Express (na avenida Independência) com dinheiro no bolso, disposto a comprar um importado (que na época, lembro bem, custava entre R$ 25,00 e R$ 30,00) e dar de cara com o "Mellon Collie And The Infinite Sadness" na estande. Não tinha como saber que um CD de uma das minhas bandas favoritas acabara de ser lançado. Tinha de ficar no bico, visitando periodicamente as lojas. E foi assim que eu coloquei minhas mãos nesta maravilha sonora, o "Disco Volante".
O crédito adquirido por Mike Patton no país ainda garantia uma certa confiança por parte dos lojistas em apostar na revenda deste CD. Como um pacote fechado, o disco veio nas costas da fama do Patton e certamente deixou muita gente de queixo caído (algo que o Fantômas viria a fazer no futuro). Banda já antes apresentada em seu álbum debut (mas nunca profundamente exposta aos olhos do público), o Mr. Bungle ainda era vista como "a outra banda de Patton" e seu som tinha a cara nítida de um circo de horrores recheado de humor negro e gostos bizarros. Embora reconhecidos pela boa qualidade de seus intrumentistas, o Bungle recheara seu primeiro álbum com tantas sonoridades diferentes que o mesmo ficou mais conhecido pela parte estética do que sonora. Muitas imagens de palhaços ou seres mascarados marcaram a banda naquela época. Foi ainda em 1995 que o Faith No More lançou o álbum sucessor do excelente "Angel Dust". Em março estava nas lojas o mediano "King For A Day Fool For A Lifetime" e a partir dele muita gente passou a desconsiderar Mike Patton. "KFAD" alcançara momentos ótimos mas deixara muitos buracos mal-explicados, o que transformou-o em um disco instável. Meio ano depois a Warner colocou no mercado o inesperado segundo disco do Mr. Bungle e quando o novo Faith No More nem bem havia sido digerido os fãs tiveram de se deparar com um fino banquete.
Lembro como se fosse hoje a minha perplexidade ao escutar os primeiros intantes da faixa inicial, "Everyone I've Been To High School With Is Dead". De letra extremamente bem sacada, o grupo retornou aos primórdios da escola e fez um dos mais estúpidos grind metals da história exorcizando seus traumas escolares. O coro dos rapazes é memorável. Em seguida, uma incrível mistura de intrumentos, calcados principalmente em bases percursivas (samba? capoeira? macumba?) tematizavam sobre casamento. "Carry Stress In The Jaw" é um pesadelo desgraçado com direito a poesia de Edgar Allan Poe, onde Patton se supera e consegue apresentar ainda mais grotescos e elaborados vocais. "Desert Search For Techno Allah" trazia a novidade dos idiomas indecifráveis, compostos pela própria banda e a inusitada mistura de eletrônicas e cultura judaica, eletrônicas essas que viriam a tomar muito do espaço antes ocupado pelos naipes de metais. "Violenza Domestica" e "After School Special" tematizam sobre assuntos sérios, mas no universo desses canalhas a coisa respinga sangue. "Phlegmatics" e "Platypus" (esta última de tempos mais antigos) detonam sonoridades frenéticas e "Ma Meeshka Mow Skwoz" volta a abranger idiomas estrangeiros com direito a murmúrios dementes. "The Bends" é a maior prova da maturidade sonora deles e a grande aposta em sons etéreos, muitos deles fortemente influenciados por trilhas sonoras. A faixa é composta por um conjunto de pequenas canções, capazes até de causar estranhas sensações de claustrofobia. "Backstrokin" me marcou por ser a primeira música 100% Patton que escutei. É nessa faixa que ele primeiro mostrou uma composição exclusiva dele e nela misturou texturas indecifráveis para depois descambar em uma base de teclado de churrascaria recheada de grunidos e berros alucinados. Foi aqui também que ele deu corda a seus vocais distorcidos e modificados que depois viriam a permear seu trabalho pós-FNM. A faixa que encerra a obra, "Merry Go Bye Bye", começa como karaokê de Elvis, passando por um death metal perfeito até encostar em um final melancólico .
Todas as faixas têm em comum a constante mudança de sonoridades, a frenética busca por desafios e experimentações. Mais amadurecidos que em seu disco inicial, tornaram-se mais evidentes as influências do avant-garde e das trilhas sonoras, sendo incrivelmente bem transportadas para dentro da música da banda. A produção magistral de Billy Anderson ressaltou muito bem a grande e exótica combinação de instrumentos que atravessa o disco. Afirmo que tive de entrar em órbita quando o CD alcançou seu final, coçando a cabeça e pensado "que cacete! que foi isso que eu escutei?". Vale citar tembém a imensa qualidade gráfica dos encartes, que ficam na cabeça da gente. Ilustrações dementes misturam figuras da National Geografic com desenhos sinistros.
Mas o mais impressionante nesse álbum é constatar o incrível salto de qualidade que a banda conquistou em poucos anos. Tanto na aquisição da maturidade musical como na capacidade de criar um disco original, interessante e extremamente experimental. Esse é para escutar às ganhas, sem medo de enjoar.


ouvindo: The Beatles: "Hello Goodbye" (Anthology 2 version)

22.4.03
 
Pessoal, desculpem pela ausência dos últimos dias. Ando com alguns problemas que têm atrapalhado um pouco meu dia-a-dia. Mesmo assim, prometo fazer o possível para dar as caras o quanto antes. Nesse meio tempo...

Coldplay - "A Rush Of Blood To The Head" (2002): Cara, como é estranha essa mídia e a maneira como as pessoas respondem a ela. Li hoje no site do Coldplay que "A Rush Of Blood To The Head" chegou novamente ao nro. 1 da parada britânica, 8 meses depois de seu lançamento oficial. Isso é, no mínimo, indício de sucesso comercial, uma vez que com tantos lançamentos no mercado um álbum de visibilidade tende a conquistar o pico das paradas e depois se estabelecer em posições inferiores. Para um álbum ir e voltar, permanecendo em posições privilegiadas por 8 meses, ele deve no mínimo ser um bom disco, de boa receptividade pelo público.
O que me chamou atenção em toda essa situação é que o álbum de maior êxito do Coldplay é, comparado com o seu antecessor, bem mais fraco. O Coldplay se notabilizou em seu debut de 2000 por, sobretudo, entregar belas baladas angustiadas. Mesmo com fortes evidências de suas influências, a sonoridade do primeiro álbum triunfou em apresentar uma banda de relativa personalidade. Com guitarras econômicas apelando para os efeitos, bateria calma e marcada e um vocal de primeira linha (acho que todos concordam que os falsetes de Chris Martin são impressionantes), "Parachutes" não só apresentou a banda como deu material suficiente para sedimentar uma legião de fãs. Tanto que o disco também arrebatou o primeiro lugar na Grã-Bretanha.
Essa curiosa ocorrência me leva a crer que o Coldplay foi, em sua segunda investida, um caso de "banda certa na hora certa". Quando muitos dos ídolos do britpop chegaram a momentos complicados (Suede mal, Oasis frustrante e Doves meia-boca), o Coldplay apareceu com a continuação de seu trabalho em meio a muita expectativa. O mega-single "In My Place" (que, vejam só, era para ter saído no primeiro disco) teve a competência de encravar nas paradas e, de certa forma, os consumidores de música pop viram naquele disco uma luz no fim do túnel. Eu também, afinal, "In My Place" é sim uma bela balada que sintetiza todas as qualidades do quarteto.
Mas acabei me frustrando um pouco quando escutei o pacote completo. "A Rush Of Blood To The Head" sofre da síndrome do segundo disco. A falta de foco é visível, as canções estão em vários formatos, das baladas folk à tentativa de emular um Pink Floyd. A fraqueza de personalidade ou talvez a dificuldade em adaptar o Coldplay a diversos estilos complicou um pouco o CD. "God Put A Smile Upon Your Face" é pouco ousada, semelhante a alguma canção que já escutei antes mas não consigo lembrar qual é. "Daylight" tem problemas de composição e dá vontade de pular a faixa quando ocorre a repetição do verso "slowly breaking through the daylight". "Green Eyes" é uma baladinha folk pra lá de comum, mesmo com a boa interpretação de Martin no vocal. "Warning Sign" é interessante, mas torna-se um pouco enfadonha depois de sucessivas audições. "A Rush Of Blood To The Head" (a música) e "Amsterdam" são fracas perto de boas baladas como as antigas "Trouble" e "Spies".
Os acertos parecem ter se concentrado em algumas faixas, que nesses casos, são acertos invejáveis. "Politk" é uma interessante abertura de disco, inusitada para os rapazes. A já mencionada "In My Place" é ótima, competente. "The Scientist" é um dos destaques do disco, uma das que se salvaram. "Clocks" é empolgante, igualmente bem composta e decidida ao sucesso.
Enfim, um album pouco consistente, com alguns acertos e alguns problemas. Enquanto "Parachutes" guardava um pouco da espontaneidade da banda, "A Rush Of Blood To The Head" veste a camiseta de artista major e arrisca ainda momentos de pretensão. Nada que justifique a atual corrida incessante por ingressos na Europa e as altíssimas e consistentes vendagens que obteram até o momento. Coisa impressionante esse mercado, não?


ouvindo: The Beatles - "The Long And Winding Road".

14.4.03
 
The Beatles - "Anthology" DVD set: Nunca fui fã dos Beatles, sou literalmente um marinheiro de primeira viagem. Na verdade, faz apenas uns dois meses que comprei o meu primeiro CD deles, "Rubber Soul". Graças ao igualmente recente Pet Sounds, dos Beach Boys, meu interesse nos anos 60 aumentou. De lá para cá, me peguei escutando o CD ocasionalmente, sem muito exagero. O meu problema com o quarteto sempre foi encontrar a mesma grandeza que um adolescente dos anos 60 (tipo, meu pai) encontrou. Sou de uma geração criada com artistas de menor valor artístico para a cultura pop, tipo Nirvana, Smashing Pumpkins, Faith No More. Muitos deles beberam na fonte construída pelos Beatles. De lá para cá tanta coisa aconteceu que fica meio complicado para as novas gerações serem magnetizada pelos Beatles em meio a tantas novas vertentes sonoras. Outra: sempre achei um saco a era da beatlemania, que mesmo embasada em emblemáticas canções pop, é um pouco repetitiva e exaustivamente explorada. Já encheu o saco chegar numa festa e ter de ouvir "Twist And Shout". Mesmo assim, contemplando a carreira deles é possível concluir que os Beatles, por mais incrível que pareça, tornaram-se material cult, erudito, perto do que se produz na música hoje. Foi então oportuníssimo o lançamento deste material para que eu pudesse ser melhor apresentado para a carreira desses caras.
O documentário compila desde os primórdios da jornada até os útlimos dias de atuação. Enriquecido por material às vezes raro, às vezes emblemático e por narrativas dos três membros então remanescentes, esse faz-se uma geral em tudo o que pode ser relevante para as grandes massas na história do Fab Four. A jornada inicia com o histórico familiar, passando pela adolescência musical até a fase pré-Beatles "como os conheceram". Embora em alguns momentos um pouco atrapalhada, a narrativa preocupa-se em mostrar que embora muita gente desconheça, os Beatles contaram com outros integrantes antes de chegar à sua encarnação definitiva. Elucidada a criação, o documentário foca por tempo prolongado a fase mais massiva deles, a chamada beatlemania. Preocupada em mostrar a evolução desde os primeiros shows de baile até os grandes estágios, a narrativa apropria-se de fatos pitorescos, declarações de época e filmagens valiosas para documentar os incansáveis anos em que os Beatles eram "os Backstreet Boys" do momento. Durante esta fase, pouco é acrescentado em termos de inovações e o pacote limita-se a ilustrar os acontecimentos.
A partir da concepção de "Rubber Soul", álbum em que eles assumidamente passaram a evoluir musicalmente, a coisa passa a ser mais interessante. É legal conferir a frase de transição, os rapazes ainda caracterizados em terninhos tocando músicas deste disco.
Mas o bicho começa a pegar quando eles abandonam as turnês e passam a atuar exclusivamente em estúdios e especiais para TV. O capítulo sobre "A Day In The Life" é ótimo, as imagens captadas durante as gravações com a orquestra dão arrepios. O produtor George Martin contribui com informações precisas e esclarecedoras, dando um ar mais sóbrio e confiável ao projeto (Paul, George e Ringo ficaram muito na base do "até onde eu lembro..."). Destaco também a oportunidade de ver videoclipes clássicos como "Strawberry Fields Forever", "I Am The Walrus" e "Penny Lane", que são raramente veiculados em nossa televisão.
Mais destaques: o broadcasting em que eles tocaram "All You Need Is Love", o VT gravado para o Ed Sullivan Show com a performance sensacional de "Hello Goodbye" e as internas do álbum Let It Be. Material o bastante para justificar o envolvimento.
Por não conhecer muito de Beatles, vou evitar fazer maiores análises quanto ao que o documentário nos permite concluir a respeito do papel dos integrantes, dos pontos principais da carreira e do desenvolvimento da banda em seus anos de existência. Fiquei com a impressão de o Lennon ser a face mais desbravadora do quarteto, muitas vezes irônico e desafiador. O Ringo pareceu ser gente fina, conformado com seu papel secundário e seguro de que Lennon/Mcartney estariam traçando os caminhos corretos. George revelou-se uma figura inconformada, infeliz com sua posição secundária. Já Paul foi incrivelmente prolífico e por vezes o mais empenhado em tocar o trabalho em frente.
Anthology tem o grande mérito de compilar a toda a carreira dos Beatles, saciando ao mesmo tempo a curiosidade de um iniciante e a ganância dos colecionadores. Momentos memoráveis estão catalogados em excelente qualidade digital, depoimentos curiosos e desmistificadores colaboram com a relevância do projeto. Bom para quem é fã, melhor para quem quer conhecer.

9.4.03
 
Não agüentei e encomendei a caixa Anthology. Nunca assisti, na época em que passou na Globo eu não estava muito interessado. Espero que corresponda, que seja mais focado na banda do que no mito comercial dos Beatles. Eu gosto de documentários idôneos, feitos por independentes que não estão contaminados pelo artista ou pelos marqueteiros das gravadoras.
Ah, encomendei também o "Elephant" do White Stripes e o tributo ao Ramones.

Recebi também uma porrada de bootlegs dos Beach Boys, que abrangem principalmente a época entre o "Pet Sounds" e o "SMiLE". Ontem à noite ouvi uma parcela insignificante do material, o que já foi o suficiente para que eu ficasse com essas músicas na cabeça durante todo o dia de hoje. Quando sair o especial do "SMiLE" aqui no blog, eu vou enumerar os bootlegs obrigatórios para quem quer começar a garimpar o universo paralelo dos Beach Boys, que é imenso e tão interessante quanto o oficial.

ouvindo: The Beach Boys - "She's Going Bald"

7.4.03
 
Slint - "Spiderland" (1991)
Fui descobrir esse disco durante o ano passado, muito tempo depois de seu lançamento. Foi no embalo do anúncio da banda Zwan, em que um dos nomes divulgados era o de David Pajo nas guitarras. Formou-se uma corrida trás dos trabalhos anteriores de Pajo e Matt Sweeney (o outro membro do Zwan) e revelaram-se para os fãs de Smashing Pumpkins as bandas Tortoise, Skunk, Chavez, Papa M e este Slint.
O Slint é de outras épocas, seu primeiro álbum data de 1989. Naqueles tempos, as pretensões sonoras de bandas alternativas eram, ao contrário de hoje, modestíssimas. Contratos milionários com gravadoras majors eram coisa para o Michael Jackson e a Madonna e a turma fazia música para si mesmo, para as pequenas cenas e para os improváveis consumidores.
Através de uma combinação tradicional de instrumentos (o trivial baixo-guitarra-bateria), o quarteto foi um dos pioneiros de uma linguagem chamada "pós-rock", que hoje alavanca nomes como o Mogwai. Sua música se caracteriza pelo total descompromisso com formatos tradicionais de música, como pontes, riffs, acordes e refrões. O universo destes rapazes é o seu próprio umbigo, é ultra individualista e surpreendentemente inovador para a época. Torna-se curioso constatar que através de instrumentos manjados o quarteto encontrou um caminho tão original.
Com um clima sufocante, "Spiderland" é coberto de penumbra e intensidade. Ao contrário do citado Mogwai, que trabalha em cima da harmonias, o Slint utiliza recursos climáticos para criar seu clima claustrofóbico. As músicas não seguem uma linha racional, da maneira que conhecemos. Muito do status cult do guitarista David Pajo veio desta obra, onde ele soube utilizar dedilhados e acordes desconexos com maestria. Com timbres sujos, as canções intercalam terrenos suaves e enclausurados com verdadeiras porradas angustiadas. Os poucos vocais são muitas vezes falados ao invés de cantados, e o instrumental segue como um rolo compressor descontrolado muitas vezes se sobrepondo à voz de Brian McMahan. Em momentos mais intensos, o vocalista usa de vocais mais agressivos causando aquela sensação de descontrole antes mantida por repetidas sequëncias de declamação contida.
É nitido no trabalho do Slint a preocupação em levantar a bandeira anti-comercial. O encarte não tem informações relevantes, brincando com o não-profissionalismo da banda. O corpo do CD é nulo, como um CD-R genérico. A banda lançaria ainda um EP sem título com uma única música. Após o final do Slint, Pajo trabalharia com John McEntire no Tortoise e juntos escreveriam mais um capítulo na história deste estilo musical, introduzindo outros intrumentos e novidades. Além disso, fez uma carreira solo independente com projetos como Papa M e Aerial M.
"Spiderland" é para quem nunca escutou o tão falado pós-rock e quer começar sem correr riscos. O difícil é num segundo momento encontrar opções à altura.


ouvindo: Placebo - "Bulletproof Cupid"

6.4.03
 
Chegou:
And You Will Know Us By The Trail Of Dead - "The Secret Of Yelena's Tomb" (2003)
Esses caras mostram que o espírito descompromissado, característico do universo indie, continua no sangue da banda mesmo depois da assinatura com a major Interscope. Embora os rapazes tenham declarado que esta não seria uma continuação do excelente "Souce Tags & Codes", as referências entre eles acabam se sobressaindo. Há aqui a mesma abertura sonora iniciada no trabalho anterior, tornando o som mais palpável e de mais fácil assimilação. Com méritos, a transição de "política sonora" ocorre com naturalidade e segurança, de forma a preservar a reputação da banda como um dos nomes do rock desencanado atual, fugindo de artifícios comerciais. Há também demonstrações de muito talento na composição das músicas, revelando as qualidades que Conrad Keely e cia. mantiveram um tanto escondidas sob paredes ruidosas em seus dois primeiros trabalhos.
Ao invés de sucumbir à pressão mercadologica de editar um novo CD, a opção por um EP dá mais tempo para projetar o próximo passo. Gravado em um curto espaço de tempo, as faixas servem como pequenas pílulas de calmante aos ouvidos impacientes, sedentos por um novo trabalho. Nota-se portanto, uma certa falta de preciosismo nas gravações que transformam o CD em um produto de entressafra. "Mach Schau" inicia o álbum com o que é mais característico no passado do AYWKUBTTOD: peso e sujeira. A faixa menos inovadora do álbum dá mais daquilo que os fãs de longa data tanto gostam. "All St. Day" caminha pelos mesmos trajetos do hit "Another Morning Stoner". Com harmonias únicas, a faixa cola no ouvido e dá certeza de que "Source Tags & Codes" foi apenas o começo de uma talentosa invasão. "Crowning Of A Heart" lembra Pixies para mim, e carrega na intensidade. Nesta faixa já é possível notar o avanço em outros campos musicais, ao passo que em "Counting Off The Days" os caras optam por inesperados arranjos suaves. A última música, "Intelligence", já havia saído no single inglês de "Relative Ways". É mais um flerte com eletrônica que melhora a cada novo lançamento.
Aos que aprovaram a notável adaptação de seu som antes primal demais ao público menos hardcore, o EP anuncia que o Trail Of Dead está cada vez menos encanado em flertar com sonoridades diversas. O CD tem ainda uma parte multimídia com videoclipes e uma seção de desenhos fabulosa, justficando o investimento.


4.4.03
 
CDs nacionais a vista:
Estão saindo pelo menos 3 lançamentos (alguns atrasados) que de repente merecem uma atenção, principalmente porque o secura está braba:
- The White Stripes: "Elephant" - O aguardado CD, o álbum que deve mostrar se eles têm ou não bala na agulha. Por sinal, toda essa nova geração vai ter de passar por esse teste de aprovação. Li críticas muito boas a respeito do disco, empolgantes, além de outras menos generosas. Mas no geral ficou uma boa impressão, dá para esperar um bom trabalho. Mesmo assim, para mim, os White Stripes não são assim tão bons quanto falam. "White Blood Cells" é o que menos me agrada, o primeiro disco é o melhor. É um tipo de som feito com o coração, com manha. O Jack White tem estilo e é um bom compositor. Mesmo assim, eles acabam fazendo um rock simples, de momento e pouca profundidade. É a banda boa para escutar no churrasco, no carro, com os amigos.
- Ministry: "Animositisomina" - Esses caras estão pra lá de decadentes, mas andei lendo bons comentários sobre esse CD. Os CDs que que sucederam "Psalm 69" foram grandes decepções, o próprio estilo industrial decaiu muito, tornou-se um pouco repetitivo. É por isso que as referências positivas chamaram a minha atenção, talvez seja um trabalho com personalidade.
- V/A: "We're A Happy Family" - O tributo ao Ramones com artistas demais peso. A escalação é legal, tem Tom Waits, Chili Peppers, Frusciante, Metallica. Algumas versões devem ser legais, enfim, em último caso é uma opção divertida.

Vamos ver, se o saldo no banco ajudar...

Ah, existem boatos de que a Trama vai lançar o terceiro do Sigur Rós, "()". Pô, não comprei o importado ainda na esperança dos caras lançarem, tô me segurando. Mas a Trama, como já comentei antes, está mais lerda do que o Rubinho Barrichelo. Õ Kid Vinil! Ô Miranda! Pau na máquina, pô.

ouvindo: Tomahawk - "Sweet Smell Of Success"

1.4.03
 
John Frusciante - "To Record Only Water For Ten Days" (2001)
A história é a seguinte: em meio ao turbilhão iniciado com o megasucesso de "Blood Sugar Sex Magik", o Red Hot Chili Peppers pulou de banda californiana cool para artistas blockbusters. Indiferente com o megaestrelato, incompatível com a sonoridade e com o ritmo da nova fase da carreira, o guitarrista John Frusciante abandona a fatigante turnê e se dedica a uma vida onscura recheada de drogas e inconseqüências. Assumidamente viciado em heroína e outras drogas pesadas, Frusciante clama por buscar nas substâncias químicas o encontro com sua ápice artístico e humano. Foram cerca de 8 anos entre o lançamento de "Blood Sugar Sex Magik" e "Californication", obra em que retornou aos Peppers. Nesse período, John dedicou algum tempo às artes plásticas e à música. Fez algumas participações em CDs de outros artistas e lançou dois trabalhos solos: "Niandra La Des/ Usually Just A T-Shirt" e "Smile From The Streets That You Hold". O primeiro, segundo ele, da época em que ainda estava nos Peppers, compilava experimentações sonoras como gravações em reverso, guitarras secas e caseiras. Linguagem complicada e reclusa, é John no seu quarto (banheiro, talvez?), um gravador, seus instrumentos e suas substâncias. O segundo CD, retirado de catálogo pelo próprio Frusciante, que o lançou para arrecadar dinheiro para drogas, levava as alucinações a planos ainda maiores e demonstrava um compositor no fundo do poço.
Foi em 1999 que John, sem dentes, tatuagens e tomado pelos efeitos de 8 anos, foi procurado pelos antigos colegas de estrelato. Os Peppers buscaram incessantemente um substituto para o cargo das guitarras, mas todas as tentativas ficaram muito abaixo do merecido (incluindo o reputado Dave Navarro). Pinçado da beira da morte, john teve de reaprender a tocar, fortificando seus dedos e realinhando sua realidade com o restante do mundo. O resultado foi "Californication", talvez o maior êxito comercial da banda e prova maior de que o guitarrista era a grande alma musical por trás da banda. Mesmo em uma obra assumidamente comercial, John é capaz de produzir momentos sublimes, servindo simultaneamente ao espírito coletivo da banda e à sua satisfção musical.
No embalo do sucesso de "Caifornication", a Warner Music concedeu à John a oportunidade de lançar seu terceiro trabalho solo. "To Record Only Water For Ten Days" tem em comum com seus dois trabalhos anteriores a proposta simples de utilizar gravadores domésticos e nenhuma produção. John aparece mais uma vez desnudo de recursos maquiadores, sua voz é rouca e seqüelada, o som é composto por guitarras, violões, teclados e muita bateria eletrônica. O ar é de fita demo, de qualidade anti-profissional.
Entretanto, a proposta é dessa vez sóbria, como uma reflexão de quem John era e de quem ele buscava ser a partir daquela nova etapa. Músicas com formato mais convencionais, vocais com nexo e proposta mais acessível mostram que John encontrou um caminho para mostrar sua arte com mais facilidade.
O álbum abre com "Going Inside", único single trabalhado pela gravadora. Nota-se em princípio que a condição "limpa" de John vai permear o álbum. Confesso que gostava muito de uma característica em sua fase anterior em que músicas complicadas e fragmentadas oscilavam entre momentos fracos e melodias brilhantes, capazes de tirar o fôlego do ouvinte. Nesta nova fase, as faixas mantém um mesmo nível de composição, mais equilibrado, com simples bases eletrônicas e o vocais roucos e balbuciantes. O grande triunfo do artista, que ao meu ver é a capacidade de criar melodias belas e brilhantes através de acordes e dedilhados complicados está espalhado por todos os lados. "Someone's", "Away And Anywhere" e "Moments Have You" flertam com technopop de forma caseira. "The First Season" e "Fallout" seguem um lado mais intimista. A proposta simples deixa as canções cruas e você vai facilmente reconhecer as qualidades de John no decorrer delas.
Se como eu, você identifica e aprecia o talento de John imerso na sonoridade fácil dos Chili Peppers, é em "To Record Only Water For Ten Days" que terás a chance de se esbaldar com sua arte, sem interências.


ouvindo: The Beach Boys - "Heroes And Villains"